Cada região tem sua maneira de celebrar, mas todas destacam crânios de açúcar, papel picado, pan de muerto e o singular humor com o qual os mexicanos contemplam a morte
Todos os anos, do final de outubro até o dia 2 de novembro, os mexicanos voltam suas atenções para as flores, velas e imagens que adornam cemitérios, capelas e residências. Com expectativa aguardam as festas com as quais receberão almas que retornam ao mundo dos vivos.
O Día de los Muertos é uma das festas mais esperadas e mais profundamente enraizada na cultura mexicana. Cada região tem suas maneiras distintas de celebrar, mas todas destacam caveiras de açúcar, papel picado, pan de muerto, comida caseira e, acima de tudo, o sentido singular de humor com o qual os mexicanos contemplam a morte.
O México é um destino que tem atraído cada vez mais viajantes brasileiros, ávidos por conhecer as tradições da cultura mexicana.
Confira os destinos sugeridos pela Travel3 para você celebrar a vida no Dia dos Mortos mexicano.
Cidade do México
Altares monumentais para o luto coletivo
Uma das grandes atrações do Día de los Muertos na Cidade do México é ver quais personalidades serão retratadas nos gigantescos altares da cidade. Assim como toda família dedica seu altar a seus entes queridos – decorando-o com flores, frutas, velas e decorações de papel picado, ou às vezes até mesmo objetos e comidas favoritas do falecido, como forma de aproveitar suas visitas anuais na terra – os altares públicos atraem multidões, seja de moradores ou turistas.
Um dos mais famosos é o altar do campus da Universidade Nacional Autônoma. Ele é elaborado por alunos de vários departamentos acadêmicos, disciplinas e idades. Caixas de madeira, sementes de amaranto ou feijão, papel crepom, flores silvestres, madeira, palha, tecidos, papel cortado e barro são apenas alguns dos materiais que são transformados em cenários, esculturas e biografias completas de pintores, escritores, músicos e outras figuras da vida cultural do México.
Zócalo, antiga praça principal da Cidade do México, é outro ponto perfeito para conferir esses tipos de homenagens e memoriais. Belos tapetes de serragem, caveiras enormes, catrinas iluminadas e todo tipo de animal de papel machê ou figura alegórica se espalham sobre a imensidão da praça.
A poucos quarteirões ao sul, na Calle Regina torna-se acontece o concurso de decoração de altar. O resultado é uma festa de flores, cores e, acima de tudo, criatividade e entusiasmo que envolvem a arte laboriosa e efêmera de recordar aqueles que nos deixaram.
Papel picado em Xochimilco
No bairro Xaltocan de Xochimilco, ao sul da Cidade do México, é possível ouvir o barulho das máquinas cortando centenas de folhas de papel de seda coloridos. Essa é a técnica tradicional para fazer as decorações conhecidas como papel picado, uma das técnicas de artesanato mais bonitas, uma marca registrada do México.
As raízes da técnica remontam ao costume pré-hispânico de decorar os altares para os mortos com papel o qual, quando se movia, fazia, segundo a tradição, a presença dos espíritos se manifestar.
Para transferir um determinado desenho para o lenço de papel, o artesão necessita de cerca de 50 diferentes formões, já que cada corte tem um tamanho diferente. Os detalhes são os mais delicados, como os dentes diminutos nas elegantes senhoras-esqueleto conhecidas como catrinas e as bordas e barras de fundo, que envolvem um trabalho cheio de complexidade.
Em uma época em que muitos estão vendendo papel que é realmente mais cortado do que o picado, uma das assinaturas inimitáveis das oficinas verdadeiramente artesanais é sua versatilidade para fazer desenhos personalizados, incluindo retratos de rostos individuais que exigem talentos extremos e concentração extraordinária.
No bairro de La Merced, perto do centro histórico, há outras oficinas artesanais que fazem desenhos incomuns, favorecidos pelos compradores em busca de vestidos de papel picado feitos sob medida ou até mesmo cenários para shows e outros espetáculos de grande escala.
Esqueletos de papel cortado dançam na brisa, dando ao cenário do Dia dos Mortos uma beleza única e efêmera, como é a própria vida.
A arte do Papier-Mâché renasce no Dia dos Mortos mexicano
Os enormes esqueletos de catrina que dominam altares monumentais em parques, cemitérios e praças são em sua maioria de papier-mâchê e revelam a sofisticada tradição da técnica de criar formas esculturais extraordinárias utilizando materiais muito simples.
De miniaturas a figuras monumentais passando por uma simples piñata (estrelas e outras formas para serem preenchidas com frutas e doces, quebradas na época do Natal) feitas a partir da mistura de folhas de jornal velho com pasta de farinha e água.
Papel de açougueiro e tintas de vinil (se for necessário um acabamento mais delicado), ou mesmo fio, dentro das estruturas, também podem ser utilizados.
Saboreie a gastronomia que acompanha a data
O pan de muerto é um delicioso pão, tipo bolo, redondo como o ciclo de vida e preparado, no seu melhor, com manteiga, gemas de ovos, casca de laranja e essência de flor de laranjeira. Eles são assados em formatos temáticos como cruzes, ossos, lágrimas e até uma bola representando uma caveira. O pan de muerto lembra a notável capacidade dos mexicanos de encontrar a parte divertida até em um tema tão difícil de ser abordado, como é a morte.
As tortas desempenham um papel de protagonista nos altares do Dia dos Mortos em todo o México. Cada região e cada padeiro tende a adaptar a receita ao gosto dos tempos, ou ingredientes disponíveis, mas a fórmula clássica ainda é respeitada, ao pé da letra, em estabelecimentos tradicionais da capital mexicana como El Cardenal ou Café de Tacuba, onde o espumante chocolate quente, com sabor de amêndoa ou canela-perfumado, é um destaque absoluto no dia.
Por mais de 100 anos, os padeiros do Café de Tacuba – um estabelecimento que abriu em 1912, durante a Revolução Mexicana – afundaram seus dedos hábeis na massa para criar as tibetanas que são colocadas no pão antes de assar. Em seguida, eles o cobrem com manteiga e o colocam em uma tigela grande de açúcar para garantir que todos os cantos e recantos recebam a maior cobertura de granulado possível, agora incrustando a manteiga.
Dizem que pan de muerto originalmente vinha da tradição pré-hispânica do sacrifício sagrado, quando o amaranto banhado no sangue do coração das vítimas era apresentado como oferenda aos deuses. Daí muitos padeiros tingirem seu açúcar de rosa flamejante. A farinha de trigo e a manteiga chegaram ao México com os espanhóis, que devem o perfume delicado da flor de laranjeira aos árabes, no período em que ocuparam a Península Ibérica. Assim, o pan de muerto é uma receita viva, que continuará misturando culturas.
O desfile do Dia dos Mortos é o momento mais aguardado
As obras de arte colossais criadas, recicladas e reinventadas para surpreender novamente os espectadores no imenso desfile do Dia dos Mortos na Cidade do México aguardam ansiosamente ao lado da cerca de ferro fundido do Parque Chapultepec, em ambos os lados do Paseo de la Reforma. Enquanto isso, a poucos metros de distância, centenas de dançarinos voluntários fazem os últimos ajustes nos trajes e fantasias. Daqui a pouco começará o desfile que, com certeza desde o seu início, será um sucesso.
Ofertas tradicionais tomam forma em altares festivos que honram os gostos e até os vícios dos mortos, que dizem visitar familiares vivos na Terra nos 2 primeiros dias de novembro. O desfile, que ocorre alguns dias antes, no final de outubro, com seus carros alegóricos, danças e altares grandes, desempenha a mesma função para milhões de moradores capital mexicana.
Crianças e adultos são recompensados com músicas, danças, risos e, porque não?, um certo divagar sobre a vida e a morte. Enquanto isso, os grupos participantes jogam fora grilhões como “hasta que la muerte nos separe” (“até que a morte nos separe). O amor dos mexicanos pelo humor relacionado à morte não tem limites. O talento e a criatividade que a data traz continua a crescer, ano após ano.
Aguascalientes
Tradições são vividas e renovadas em Aguascalientes. Na noite de 1º de novembro, é realizada a tradicional Parada de Esqueletos. Ao lado de carros alegóricos vividamente decorados para a ocasião, foliões fantasiados caminham pelas ruas do centro em meio a multidões que param para surpreender, se alegrar e celebrar a vida assistindo ao desfile.
Outro local imperdível para o turista conhecer é o Museu Nacional da Morte, no centro de Aguascalientes. A cada 31 de outubro, grupos de estudantes de diferentes cursos da Universidad Autónoma de Aguascalientes montam altares dedicados a um personagem ou tema, desde o cinema mexicano da era de ouro até o imperador asteca Moctezuma. A criatividade pode ir tão longe a ponto de incluir instalações e performances de estudantes em caráter. Além disso, vários prédios históricos em toda a cidade – como a Casa Terán ou o Museo Regional de Historia – colocam altares espetaculares para visualização pública.
Outra tradição que está muito viva em Aguascalientes é assar o pan de muerto, o pão do morto. O Pavilhão do Pan de Muerto está instalado na Isla San Marcos, onde, durante o Festival de las Calaveras, várias atividades acontecem; há uma área onde as crianças podem fazer suas próprias versões em miniatura de bolos pan de muerto, por exemplo. Enquanto o pão é preparado, os visitantes podem testemunhar todo o processo.
A partir de 1º de novembro, as pessoas se reúnem para lembrar seus entes queridos que partiram no cemitério Gayosso (antigo Jardines Eternos). Eles trazem flores e comida para decorar túmulos e apresentar oferendas a parentes e amigos mortos. No cemitério de Jesús María você pode até ver famílias honrando a memória dos mortos com apresentações de música ao vivo em torno de tumbas individuais. A 45 km da capital do estado fica a cidade de San José de Gracia. A atração aqui é ver as sepulturas e criptas decoradas, pintadas e enfeitadas. Alguns, de acordo com a tradição milenar, ainda mantêm vigília no cemitério até as primeiras horas de 2 de novembro, Dia dos Mortos.
Este, assim como o desfile da cidade em 1º de novembro, faz de Aguascalientes um destino ideal para vivenciar o Dia dos Mortos mexicano.
Na Isla San Marcos, a cerca de 4 km a sudoeste do centro de Aguascalientes, uma escultura monumental de uma figura de catrina muito atraente recebe os visitantes do Festival Cultural de Calaveras.
O espaço – mais um parque do que uma ilha em si – é o lar da popular Feira Nacional de San Marcos, celebrada todas as primaveras desde 1828, e é o local oficial do evento Calaveras, onde tradição e cultura contemporânea se encontram de frente. Seus estandes abrigam uma série de altares que mantêm o costume mexicano de oferendas de flores, velas e alimentos para os mortos muito vivos. Os participantes recebem prêmios por criatividade. À noite, os altares e suas oferendas são iluminados com luzes e velas, e seus criadores ainda vestem roupas para complementar o que eles montaram.
Michoacán
Em Michoacán, as celebrações do Dia dos Mortos são um legado que vem dos habitantes originais da região, os Purépecha (também conhecidos como Tarascas). Eles falam uma língua singular (que remete ao povo quéchua da América do Sul) e habitam a maior parte do estado.
Além dos lagos de Michoacán, cidades antigas e artesãos talentosos, a celebração do Dia dos Mortos é uma atração que faz da região um extraordinário destino de viagem.